sábado, 12 de julho de 2008

Dezenove - Paco 01

Paco abrira os olhos. Primeiramente não sabia onde estava, mas logo adivinhara. Paredes brancas, teto alto, luzes fortes e, estando deitado numa maca com um soro espetado em seu braço, só podia estar em um hospital, ainda mais depois dos últimos acontecimentos.



- É aquele mercadinho da Luís Mafra, Paco, que acha?

- Aquele do bigodudo antipático?

- É.

- Bem que ele merece. Não gosto de fazer isso com pessoas que parecem boas. Aquele cara tem algo que sinceramente não me agrada...

- Então...



Ele ouviu a porta abrir, continuou deitado, estava um pouco tonto. Ela veio até ele e viu que estava acordado.

Os olhos dela!

Até hoje Paco não conseguiria dizer a cor, dependia de como ela lhe olhava. Podia ser verde, azul, mel, escuro... Podiam não ser...

Independente do que estivesse passando pela cabeça dele, a enfermeira lhe deu um sorriso reprovador e irônico:

- Então resolveu não dormir para sempre... – falou ela, mais para si mesma do que para ele.

- Desculpa, não estou entendendo...

- Nada não senhor – seu tom era mecânico – gostaria de lhe fazer algumas perguntas, para preenchermos seu cadastro aqui no hospital...



“Nunca olhe nos olhos deles!” Enquanto Paco conferia se sua arma não dava volume à sua roupa, lembrava-se dos conselhos do Cujón, seu antigo mentor em sua, digamos, profissão. “Se precisar atirar, e acertar, nunca olhe nos olhos deles!”

Paco nunca precisara, mas confessava que nutria uma certa curiosidade em relação a isso. Mais para saber o porque de seu antigo amigo lhe repetir tanto essas frases do que por maldade ou desejo gratuito de destruição.

- Não é hora de ficar pensando no que passou – repetiu para si próprio no espelho – hoje é dia de ação!

Saiu de casa e se encontrou com Ernesto, que planejara o golpe.

- E aí Paquito? Firmezinha?

Paco não gostava muito da confiança que Ernesto achava que tinha. Em seu ramo, não podia confiar nas pessoas, ainda mais quando estas usavam gírias escrotas.

- Bem, bem sim Ernesto.

- Ta tudo combinado então né Paco? Prefere repassar mais uma vez a parada toda?

- Não Ernesto, entendi da outra vez já. Uma vez é suficiente.

- Tá, tá... Bora moleque!

Desceram pela rua e avistaram o mercado. Ele era simples, lembrava um daqueles secos e molhados de antigamente, com apenas um balcão e as mercadorias atrás do atendente do balcão.

Passaram pela frente do mesmo uma vez e viram que estava vazio, apenas o velho bigodudo atrás do balcão. Na volta, Paco sentia-se apreensivo e ansioso. Uma noite em claro entre o whisky e a coca não ajudavam muito no processo, mas vivia-se. A menos de 10 metros da porta, eles colocaram a máscara de lã que traziam nos bolsos, sacaram a arma, e, ao entrar, Ernesto gritou:

- NÃO TE MEXE BIGODE! É UM ASSALTO!



- Nome?

- Como?

- Seu nome senhor...

- Paco Rodriguez Silveira.

- Paco... é nome mesmo isso? – hum, ela era humana afinal.

- Sim, minha mãe é chilena.

- E seu pai?

- Do mundo, não o conheci.

Um silêncio constrangedor envolveu a sala, ele notou até um sinal de arrependimento por parte dele, mas que logo se desfez e virou impressão.

- Idade?

- Vinte e seis.

- Usa algum medicamento?

- Não.

- Alguma substância química?

Agora foi a vez dele ficar constrangido.

- Não... Nada com freqüência.

Ela o encarou com curiosidade.

- Seus exames não demonstram isso senhor – ela fez um muxoxo com aqueles lábios que estavam hipnotizando Paco – mas isso não me diz respeito. Porém, o doutor Alfredo quer recomendar sessões de terapia para o senhor, e lá seria interessante sua sinceridade.

- Terapia?

- É normal depois de uma tentativa de suicídio senhor.

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