domingo, 11 de maio de 2008

Dezoito

Três homens em um funeral
bêbados (lógico)
chovia.
Como em todo bom funeral doloroso.

Três homens em um funeral na chuva.
Um tem guarda-chuva.
Um usa capa.
Outro tem a alma enlameada.

Uma mulher desce sete palmos.
Um bêbado soluça (de dor?).
Um bêbado chora amargamente.
Outro recolhe sua dor.

Caem as pás de terra.
Um ébrio vai embora.
Um ébrio não sabe onde ir.
Outro pensa na efemeridade da vida.

Fecha-se o buraco.
Um foi apaixonado.
Um amou.
Outro viveu sua vida.

Dezessete

Era uma quarta (ou seria segunda? tanto faz) a noite e lá estava eu sentado em minha casa, ouvindo algo bom e bebendo alguma coisa amarga com graduação alcoólica acima dos trinta por cento. Dentro deste momento de paz comigo mesmo, chega meu amigo Aureliano, que era sempre bem-vindo.
- Fala Campe! Qual é a boa?
- Olha Arcádio - era um trocadilho horrível que pouca gente entendia e só eu gostava. Por isso mesmo usava – ainda não sei. To meio baleado e tenho que trampar amanhã cedo.
- Ah, pára! Vamos sair, tô com uns esquemas aí. Vamos na casa de uma amiga minha!
Conhecendo o Aureliano até já imaginava que tipo de amiga seria. Mas, vendo ele minha hesitação e me conhecendo bem, logo falou:
- É aquela menina que eu conheci naquela festa semana passada!
- Que festa? – memória boa não é algo presente em mim. Álcool em demasia, creio eu, mas quem bebe pra lembrar?
- Aquela na casa daquele cara que você e o Josias ficaram esperando o cara embaixo do prédio dele com dois paralelepípedos nas mãos... E isso porque ele encheu o copo de vocês pela metade.
Lembrava de algo assim. E acho que lembrava da menina.
- Não era aquela de blusa rosa escrita “alguma coisa fofa” girl, que parecia um pogobol né?
- Não! Essa tava dando em cima de ti, lembra?
- Ih caralho, é verdade!
- Então, era a que tava na turma do lado da gente ali.
- Ah! Uma de blusa prateada? – nem sei se tinha alguém de blusa prateada.
- Não, não era a feia – e não é que tinha? – era a bonitinha. Não era a loira suicida, era a que tava vomitando no dia...
- Hum, acho que sei – não tinha a mínima idéia, mas não tava a fim de ficar naquela agonia de rememorar e ficar naquele sofá amnésico por mais uma meia hora ou mais, discutindo detalhes nem um pouco importantes.
- Então, vamos lá?
Não tendo nada melhor pra fazer, fui.
No caminho eu e Aureliano fazíamos a via sacra, parando de posto em posto para comprar cerveja, e olha que a casa dela era longe.
- Chegamos Campe – disse o meu singelo amigo todo animado, estacionando na frente de um prédio.
- Hum, legal – eu estava com sono, e praticamente embriagado.
Chegamos na portaria e ele pediu para o porteiro:
- Susana do 215, por favor.
O porteiro com uma cara de sacana, nos olhou de alto a baixo e, com aquela boca que sempre cospe ao falar, disse:
- Hum. São os amiguinhos de hoje?
Nós dois ignoramos o comentário. Era isso ou espancar o cara.
Ao chegar na porta do apê, ela já nos esperava:
- Oi rapazes, entrem – deu um beijinho no rosto de cada um – ali tem cerveja e uísque, fiquem a vontade.
Aureliano foi direto na cerveja enquanto eu preferi o 8 anos, que no caso presente, não passava de 4 anos. Vai assim mesmo.
Ela estava no quarto e gritou:
- Sentem e fiquem a vontade, já estou chegando.
Ao fundo tocava algum tipo de música eletrônica lenta ruim, e a iluminação estava à meia-luz. Aquilo tudo era muito estranho, mas como meu eterno parceiro estava curtindo à beça, fiquei quieto.
Nisso, ela sai do quarto.
De calcinha, sapato de salto alto, algo parecido com um baby doll e dançando alucinadamente, vindo pra cima do Aureliano, e me deixando sem entender mais nada.
Resolvi beber mais.
Quando me dei conta, ela estava sem a calcinha sentada na cara dele, em movimentos pélvicos, e por mais estranho que pareça, aquilo não me excitava, eu só tava meio perdido. Nisso, ele tira a cara de lá e diz:
- Agora é a vez do Campe, vai!
Nisso ela vem e abre as pernas em cima de mim, colocando minha nuca contra o encosto do sofá.
Ok, ela tinha uma bunda esculpida a mão, e pernas melhores ainda, mas eu nem a conhecia, e o Aureliano tinha acabado de lamber tudo por ali.
- Isso é hora de ter nojo? – pensei comigo mesmo.
E fui.
Fiquei ali por uns 25 minutos – na verdade não devem ter sido 3, mas deixa pra lá – quando ela sai de cima, vai pra frente de nós dois dançando e diz:
- Tá garotos, agora o resto tem que pagar mais 150 reais.
A ficha caiu. Estávamos numa zona. Santa ingenuidade Batman!
- Não, acho que vamos ficar por aqui mesmo – disse Aureliano – bora Campe?
- Ah não! – ela gritou – antes vocês tem que me pagar o strip!
- Paga ela aí Campe...
Filho da puta! Eu tinha cinco reais no bolso!
- Porra Arcádio! To sem grana cara!
- Eu também...
- O que? – ela se transformara – vou ligar já pro Amadeu!
Resolvi não ficar lá pra descobrir quem era o Amadeu, num pulo, levantei e abri a porta, e corri, ouvindo os passos pesados de Aureliano atrás. Apesar de estarmos no sexto andar, fomos pela escada e quando chegamos fora do prédio, ouvíamos ela berrando pela janela:
- Filhos da puta! Eu acho vocês! Mando matar.
Entramos correndo no carro, e assim que arrancamos, eu só conseguia dizer:
- Caralho! Seu merda! Puta que pariu! – e demais coisas do tipo.
Aureliano ria, ria como nunca, com todos aqueles seus dentões para fora.. Me dei por vencido e comecei a rir também. Ele era um filho da puta, mas era o meu filho da puta.
E seguimos pela noite, como em tantas outras, como anjos bêbados e loucos, errando dentro da nossa pureza, e deixando nossa consciência se acertar com o nosso desejo.